Brincadeira a matéria que deu a manchete da Folha de hoje. Consegue relacionar o contador Antônio Carlos Atella Ferreira – que entrou com o pedido pra conseguir os dados fiscais da filha de Serra com procuração falsa – até com o caso Celso Daniel. A linha de raciocínio é realmente admirável. Pra quem não leu:
Registro em cartório e relações familiares derrubam versão do PT sobre contador
FLÁVIO FERREIRA
SILVIO NAVARRO
DE SÃO PAULO
Registros nos cartórios eleitorais de Mauá e Ribeirão Pires (Grande São Paulo) e relações familiares derrubam a versão do PT de que o contador Antonio Carlos Atella Ferreira, responsável pela violação do sigilo fiscal de Veronica Serra com uma procuração falsa, não tem ligação com o partido.
Os documentos nos cartórios desmentem a versão de que a filiação de Atella não foi efetivada por erro de grafia do nome dele, como a Folha.com revelou ontem. No final de semana, o PT argumentou que a filiação de Atella não havia se consumado pois o registro havia sido feito com a grafia do nome errada -constava "Atelka" e não Atella, segundo o partido.
No entanto o banco de dados da 217ª Zona Eleitoral, em Mauá, indica que Atella é filiado ao PT desde 20 de outubro de 2003. Para a Justiça Eleitoral, nunca houve pedido formal de desfiliação da sigla. O tribunal informou que os partidos atualizam as listas de filiados duas vezes por ano.
Em 10 de abril de 2006, ocorreu mudança do domicílio eleitoral do contador para Ribeirão Pires. Ou seja, para a Justiça, Atella passou a ter filiação partidária em Mauá e domicílio eleitoral em Ribeirão Pires.
Isso levou o sistema eletrônico do TRE paulista, em novembro de 2009, a excluir o nome dele do banco de dados. O sigilo de Veronica, filha do candidato do PSDB à Presidência, José Serra, foi violado dois meses antes.
O fato de o nome de Atella ter sido excluído do banco de dados não significa que ele tenha sido desfiliado. O cartório da 183ª Zona Eleitoral emitiu uma certidão na qual declara que "não há pedido de desfiliação do eleitor acima mencionado (Atella) nos arquivos desta unidade eleitoral".
Atella negou filiação partidária no primeiro momento. Mas, após o TRE-SP confirmar o vínculo, disse que "não se lembra" da filiação. Tão logo a filiação foi divulgada, o presidente do PT, José Eduardo Dutra, se apressou em negar o vínculo dele com a sigla.
FAMÍLIA
A família de Atella é militante histórica e fundadora do diretório do PT de Mauá na década de 80. Neuza Maria Ferreira Jaloretto, sua irmã, é filiada ao PT desde 21 de maio de 1981. A inscrição dela foi feita na 217ª Zona Eleitoral, a mesma em que Atella deu entrada na sua filiação.
Servidora da área da saúde da Prefeitura de Mauá, ela é casada com o oficial de Justiça João Primo Jaloretto, fundador do PT na cidade. Segundo o presidente do PT paulista, Edinho Silva, Jaloretto é militante histórico. O ingresso no PT ocorreu a partir de associações de bairro nos anos 80.
"Ele [João Primo] foi fundador do PT de Mauá, é militante do PT", disse. A família Jaloretto é dona de um imóvel alugado para as atividades políticas do deputado estadual Donisete Braga (PT). O aluguel, no valor de R$ 1.340 mensais, é pago a Durvalino Jaloretto com a verba do gabinete de Braga na Assembleia Legislativa.
Integrante do grupo político do prefeito Oswaldo Dias (PT), Braga é uma das lideranças do partido no ABC. Ele enfrentou processo -arquivado em 2006- por envolvimento no assassinato do prefeito Celso Daniel (PT). A quebra do sigilo telefônico de Braga, que nega envolvimento no crime, revelou que ele estava próximo ao local do cativeiro de Daniel um dia antes da sua morte.A família de Atella em Mauá é ligada à do prefeito Oswaldo Dias. As filhas de ambos, Letícia Dias e Juliana Jaloretto, estudaram juntas. Hoje, o filho de Dias, Leandro, preside o diretório municipal do partido após seu grupo derrotar o do ex-vice-prefeito Márcio Chaves. A Folha identificou mais dois familiares petistas em Mauá: Maria do Carmo Jaloretto, filiada desde abril de 1981, e Anna Clélia Jaloretto, desde 1988.
Colaborou RANIER BRAGON, de Brasília
Resumindo, é isso: Atella é irmão de Neuza, filiada ao PT e casada com Jaloretto, fundador do partido em Mauá. A família deste (a família do cunhado, nem sequer este mesmo) tem um imóvel alugado pelo deputado estadual Donisete Braga (PT), que foi investigado (não condenado, pois o processo foi arquivado) por envolvimento no caso Celso Daniel.
Alguma dúvida de que a grande maioria dos leitores passará batida pela debilidade da linha de relação e simplesmente engolirá a ideia de que esse procuradorzinho é mais um desses sujos do PT?
E outra coisa: desde quando a imprensa se importou tanto com quebra de sigilo a ponto de se concentrar inteiramente nessa ilegalidade e não nas informações resultantes dela? Quantas vezes os noticiários se valem de informações vazadas irregularmente da polícia, do Ministério Público, do Judiciário para rechear as reportagens no vácuo deixado pela falta de jornalismo investigativo? E as câmeras escondidas?
Quebra de sigilo é grave. A resposta certa é sair quebrando regras mínimas de coerência e até bom senso?
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