31 de julho de 2010

A cara da social-democracia brasileira

As últimas declarações de José Serra e de seu vice, Índio da Costa, demonstram o tamanho do problema eleitoral com que se depara o PSDB. Durante a década de 1990, o partido conseguiu emplacar sua agenda política – Estado mínimo, estabilidade econômica, etc. –, o que parece, na esteira de um pensamento econômico único, ter esvaziado um discurso propriamente mais de esquerda. Era a tecnocracia superando a ideologia.

Mas os oito anos de um governo petista à frente da República parece ter embaralhado os discursos. A suposta esquerda se firmou como um excelente gerente do capital especulativo – às custas, é bem verdade, do primado ético de que sempre se orgulhou –, deixando ao PSDB duas opções: vender-se, por um lado, como a esquerda que o PT teria deixado de ser – angariando para si os beneficiados e os admiradores das conquistas sociais da era Lula –, radicalizar, por outro, um viés latente desde de sua aproximação com PFL: uma guinada sem máscaras ao que há de mais conservador na direita.

Se instaura, assim, uma espécie de esquizofrenia política: destronada daquilo em que reinava absoluta, a oposição atira para todos os lados, buscando desesperadamente reconquistar os votos que, pesquisa a pesquisa – excetuando, claro, o enigmático Datafolha – lhe escorrem pelas mãos.

Acontece que, no espectro político mais à esquerda – seja ele mais próximo aos  inflamados do PSTU ou à entourage do PT –, essa estratégia tem feito água. Resta, então, aquele eleitor mais à direita, naturalmente inclinado a não votar no partido de Lula sob hipótese alguma.

O problema – e o perigo – está na mescla espúria  que surge como conseqüência da aproximação de um partido social-democrata daquilo que há de mais conservador no cenário político brasileiro: a defesa da democracia, da liberdade de imprensa, do Estado de direito passa às mãos daqueles mesmos que, por mais de duas décadas, foram os primeiros a pô-los em suspenso:

Memorial 1964

O clamor das manifestações públicas e sociais do início de 1964 desaguou no Movimento Democrático de 31 de março, marco imorredouro da evolução política nacional, quando as forças democráticas, lideradas pelas Forças Armadas e em defesa da nossa Soberania, impediram que o comunismo internacional tomasse o poder. Eterna homenagem aos que lutaram em prol da Democracia e da Liberdade.

Esvaziados daquilo que possuem de mais radical, conceitos como Democracia e Liberdade perdem sua capacidade transformadora, ficando limitados a uma democracia de minorias e uma liberdade de fachada, ambos encobrindo um pensamento econômico e social uniforme e elitista. Esse parece ser o triste legado da social-democracia brasileira.

27 de julho de 2010

Dois pesos, duas medidas

Eu faço parte de um grupo bastante privilegiado, que nunca precisou entrar numa fila, de madrugada, para conseguir uma senha, ser atendido ou qualquer coisa do gênero. No entanto, eu consigo entender que aqueles que o fazem, o fazem por necessidade.

Menos  compreensível é a fila em frente ao consulado americano. Minha entrevista estava marcada para as 7:30, mas, como sou ansioso, acabei chegando lá uma hora antes. E qual foi minha surpresa? A fila, imensa, já se estendia para fora do consulado.

Mas, sinceramente, isso foi o de menos. (Mesmo muito grande, ela andava com uma certa celeridade.) O pior era como os funcionários brasileiros do consulado nos tratavam. Não foram poucas as vezes que eu imaginei como será minha chegada aos EUA, como serei tratado pelos policiais americanos no aeroporto, coisas desse tipo. O que nunca sonhei era que teria uma prévia disso aqui mesmo.

Logo à minha frente na fila, ainda do lado de fora, estava uma família. Pelo que entendi, era a filha mais velha, uma menina de seus 14 anos, que iria tirar o visto. Ao chegar à porta do consulado, o pai foi barrado: somente um dos responsáveis poderia entrar para acompanhar a filha. O pai tentou argumentar, entraria apenas para ajudar a mulher com a filha mais nova: um bebê ainda de colo. A resposta da funcionária do consulado foi de uma grosseria sem tamanho: a mais velha era grande o suficiente para ajudar a mãe.

Lá dentro a situação não mudou. Depois da segunda fila, a da pré-entrevista, e antes da terceira, a das impressões digitais, as pessoas foram se sentando nos vários bancos que haviam por lá. Acontece que toda área à direita estava reservada para a quarta fila, a da entrevista propriamente dita. Pois bem, a funcionária responsável pela organização das filas, que não eram nada organizadas, não ficava atrás no quesito grosseria: “desocupem os bancos”, “saiam do meio do corredor”, “acompanhem a ordem da fila”… E os imperativos se multiplicavam.

O mais interessante disso tudo era a atitude de pessoas que, por nenhum outro motivo, se submeteriam a entrar numa fila de madrugada. Senhores envergando seus ternos; senhoras bem vestidas; adolescentes com suas calças de marca, todos, sem exceção, obedeciam às grosserias sem o menor sinal de revolta. Pessoas que, noutra situação qualquer, estariam bradando seus “você sabe com quem está falando?”, ou reclamando da incompetência do governo, incapaz de qualquer espécie de organização, essas pessoas se submetiam, sorridentes, a toda uma situação vexatória em busca de um visto para entrar nos EUA. E pra que? Segundo a senhora à minha frente, Miami é o lugar pra se comprar barato… 

22 de julho de 2010

Humor em campanha

A gente fez este blogue pra escrever textos mais compridinhos e de análise (ou pelo menos metidos a isso), eu sei. Mas não resisto a postar os dois vídeos seguintes. São amostras de como, na internet, o humor também deve render na campanha.

Alguns talvez não conheçam o contexto. O primeiro se refere a uma reação meio raivosa de Serra no programa Roda Viva a uma pergunta sobre pedágios feita por Heródoto Barbeiro. A isso se seguiu, de acordo com o blog de Luis Nassif, entre outros, uma intervenção do tucano na demissão do jornalista do cargo de apresentador do programa. Depois foi a vez de Gabriel Priolli, que deixou a gerência de jornalismo da TV Cultura logo após uma reportagem também sobre os pedágios.

O outro vídeo  remete ao fato de policiais terem agredido  professores da rede pública estadual  de SP durante a última greve.

19 de julho de 2010

O “trololó” sobre o controle da mídia, de novo

Por mais deprimente que seja, era esperado que a história do medo dos “radicais do PT” aparecesse na campanha para presidente, mas talvez não logo no seu início oficial. Primeiro foi a capa da Veja da semana passada, com um dragão vermelho de cinco cabeças representando “o monstro do radicalismo”. Depois foi o vice Índio chamando Dilma de guerrilheira e ateia. Falta de ideia melhor? Desespero?
 
A Veja, que antes via em Lula o risco de não domar os monstros radicais, agora é só elogios pra habilidade política do presidente, mas não deixa de desconfiar da capacidade de sua pupila para domar a fera. Os argumentos são basicamente dois. Em primeiro lugar, a lambança que a campanha de Dilma fez ao protocolar do TSE, como programa de governo, o programa do partido, que conteria as tais ameaças à democracia. Evidência, claro, de que o discurso moderado seria apenas maquiagem de campanha, enquanto os planos de dominação estariam internamente bem claros para os petistas.
 
Em segundo, a inexperiência política da pupila: puseram um cientista político para prever uma “briga fratricida de consequências imprevisíveis”, caso os resultados econômicos de um possível governo Dilma decepcionem. Fora o argumento de autoridade (e essa posição dificilmente seria consensual na área, imagino), não se apresentam fatos a sustentar essa tempestade no horizonte.
 
O pior é que, estando de férias aqui em Salvador,  vejo em conversas na família que a coisa não deixa de ter suas consequências, e eis que se repetem as falácias todas, inclusive a de uma suposta tendência petista a controlar os meios de comunicação. Passei um olho nas temíveis propostas de comunicação do PT, baseadas nos resultados da Confecom – Conferência Nacional de Comunicação, que aconteceu no ano passado.  Propostas feitas por grupos de trabalhos formados por pessoas de diversas áreas de atuação e diversos estados. Têm valor só de consulta para o governo federal, e não normativo. Mas dão um medo, cruzes!
 
Já em uma das seções introdutórias do documento do Ministério das Comunicações que divulgou as propostas, o leitor da Veja certamente esperaria encontrar a demonização do empresariado da comunicação nacional, pois ali é feito um panorama histórico do setor no país. Em vez disso, encontra-se, por exemplo, uma afirmação como esta, a respeito de Chateubriand:
“Se hoje a telenovela brasileira é um dos produtos mais conhecidos em diferentes continentes, a TV surgiu do improviso e da ousadia empresarial de um homem de negócios que enxergou o futuro”.
Se isso não for o bastante para fazer tremer os meios de comunicação empresariais, que se preparem para esta tirânica declaração de vontade quanto à rede mundial de computadores:
“Manter livre de restrições a circulação de informações pela Internet.”
Os petistas, como se percebe, pretendem transformar o país não na Venezuela Chavista, mas sim na China. Daqui a pouco o pessoal da Google também nos deixa.
 
O que explica tanta preocupação, no fundo, só pode ser a abertura de discussões sobre a concessão pública para a radiodifusão. É de propósito que nunca se dispõem a pôr, de um lado, a imprensa e, de outro, o rádio e a TV. No caso desses últimos, há uma limitação física quanto aos canais possíveis. Pense na TV VHF ou na rádio FM, por exemplo. Em parte por isso, cabe ao Estado dizer com que critérios serão obtidas as concessões para as empresas e de acordo com que objetivos. A questão do sinal digital pode ter mudado um pouco as coisas, especialmente quanto â limitação, mas acredito que o quadro geral seja esse aí.
 
Como a concessão ocorreu na prática no Brasil? Sempre por meio de influência, não política, mas de politicagem. O número de rádios nas mãos de políticos, sempre que divulgado, impressiona. Na Bahia, a retransmissora da Globo é da família de ACM desde que este foi ministro das Comunicações de Sarney. E sabemos bem qual o efeito disso.
É essa a liberdade que se trata de proteger: a de tomar um espaço de interesse público, que deveria seguir critérios estabelecidos pela Constituição, como coisa privada, um negócio feito outro qualquer. Isso não impede, contudo, que os empresários façam valer seus interesses politicamente.
 
O que realmente assusta nas propostas da Confecom, assim, só pode ser a disposição de discutir o problema das concessões. Fala-se ali em fiscalizar o cumprimento das diretrizes constitucionais sobre o tema; da publicidade dos dados relativos às concessões; da obrigatoriedade de os interessados apresentarem, no momento da renovação, documentos comprovando que cumpriram suas obrigações, etc. Enfim, alguém parece lembrar que se trata de um serviço público, e que as empresas devem ser cobradas por isso.
 
Além disso, certamente não agradam muito as propostas de limitação do direito de propriedade relativo aos meios de comunicação: aumento da restrição para propriedade por estrangeiros e, o que deve soar como heresia para um grupo como a Globo, a proibição da propriedade cruzada de meios de comunicação (quando a empresa tem jornal, revista, rádio, TV), sempre para controlar a criação de monopólios. Partidários mais renhidos do capitalismo nada teriam contra esse tipo de proteção, suponho.
Acredito que a questão do Conselho de Jornalismo não incomoda. Só aparece no meio das lamúrias pra fazer nuvem de fumaça e ainda é uma cereja do bolo na cooptação de jornalistas, que surpreendentemente agem como quem não sabe de nada ao repetirem, com convicção de teleprompt, editoriais a favor dos patrões.
 
Mesmo que o plano de governo de Dilma seja uma espécie de Mogwais (aqueles bichinhos fofinhos) prestes a transformarem-se em Gremlins, é de se perguntar de quem mesmo devemos ter medo. A questão não é se a mídia deve ser controlada, mas sim impedir que uns poucos a controlem se lixando pro interesse público.
 
PS - Era pra eu falar de outras coisas, mas este post já tá grande demais. A edição da Veja com o dragão na capa é um primor, e muito inspiradora.
 
- Veja aqui o documento sobre o Confecom (clicando em “saiba mais”, aparece a opção de baixar o arquivo).

10 de julho de 2010

O eleitor não é um Homer

A aprovação do Ficha Limpa teve recepção das mais positivas, variando do elogio protocolar, de flerte com a hipocrisia, até as mais otimistas, quando não ingênuas, comemorações. Mas teve também quem atentasse para uma dimensão em média menos percebida: impedir que alguém se candidate se tiver ficha corrida de corrupção ou algo afim é também duvidar da capacidade de os eleitores decidirem por eles mesmos. Em nome da democracia, desconfia-se do discernimento do povo para exercê-la pelo voto: com o fim de resgatar a credibilidade das eleições, seria então preciso desmoralizar um de seus princípios de funcionamento e validação.

Como resposta, alguém poderia dizer: ora, todo mundo tem capacidade de votar, mas isso só se desenvolve plenamente dentro de algumas condições, entre elas o acesso a informações de qualidade. E, em nosso país, os desequilíbrios nesse campo vêm de todo lado: a começar pela educação, mas também passando pelas diferenças de acesso aos variados veículos jornalísticos.

Quanto a estes, uma pesquisa da Secom da Presidência traz algumas informações interessantes. Para 2/3 dos brasileiros, a TV aberta é o principal meio de comunicação, e 69% a consideram o mais confiável. Com o histórico que temos de distribuição de concessões públicas por politicagem, a altíssima concentração de propriedade na área, a péssima educação pública, como confiar no discernimento do pobre cidadão médio, reduzido a um Homer Simpson com tudo para ser marionete?

Só que, se o pretenso Homer não é nenhum Descartes, também tem seu quinhão de desconfiança: 72% acreditam muito pouco e 7% não acreditam nada do que diz a mídia. É, 80% sabe relativizar bastante o que lê ou vê por aí. Engraçado que até – ou sobretudo? – entre gente sabida impera a imagem do telespectador passivo, o zumbi abestalhado e hipnotizado pelas gigantes midiáticas.

A eleição de 2006 poderia ter sido uma lição para muita gente. A população, aparentemente, se indignou sim com o “mensalão”, tanto que a popularidade de Lula caiu. Mas também terá, quem sabe, percebido as realizações do governo e, talvez mais ainda, deu-se conta de que do outro lado estava não um mensalão, mas quinhentos anos de história de pouco apreço pela coisa pública (um quinhentão). E Lula foi reeleito. Isso a despeito de verdadeiro massacre midiático, em níveis que, nos piores casos, beiravam o golpismo à Venezuela.

Fica a esperança de que, com ou sem Ficha Limpa, e apesar da concentração de propriedade dos meios de comunicação, o eleitor médio tenha muito mais discernimento do que muitas vezes se pensa.

6 de julho de 2010

Sportv, Paraguai e o nosso novo-riquismo

A Sportv, da Globo, fez uma matéria inacreditavelmente infeliz sobre o Paraguai. Ouvi falar disso, mas pensei que tinham apenas dito algo como “o Paraguai só chama atenção por causa do decote de Larissa Riquelme” (aliás, é impressionante que desde o início se tratava de uma propaganda do celular). Mas não, é muito pior: o repórter chama o país de “paraíso obscuro do mundo”, ironiza Ciudad del Este, como se não tivéssemos nada a ver com  tríplice fronteira, zomba da ausência de praias, da cozinha, da moeda… Nem uma cantora pop foi poupada. Um horror. E nem é engraçado.

Por um lado, mostra como o flerte do jornalismo esportivo com o humor corre o risco de recair em preconceitos e reforçá-los, o que é visível em todas as matérias engraçadinhas sobre carinhos entre jogadores. Com certeza, as brincadeiras são melhores que o histerismo raivoso das mesas redondas, mas a Globo, por exemplo, continua fazendo vista grossa às maracutaias do futebol. E aí perde a graça.

Por outro lado, a matéria bem pode ser uma amostra de que tem brasileiro já se achando... Até quando reclamaram de Lula pegar leve com a Bolívia quanto à Petrobras dava pra notar algo desse nariz empinado de novo-rico. É o velho perigo de ser centro da periferia. Já via um pouco isso em Salvador, quando pessoas do interior me diziam que os soteropolitanos eram metidos; e aqui em São Paulo, apesar das muitas exceções, é o que não falta.

Parece ter havido fortes reações no Paraguai. O La Nación publicou uma resposta forte, com esse belo trecho:

“Con Brasil eliminado ¿qué dirá ahora Sport TV de Globo? ¿Tendrá la suficiente humildad para la autocrítica, o seguirán con la hipocresía de vivir a espaldas de sus grandes problemas como el racismo, sus millones y millones de pobres, las matanzas, el tráfico de drogas en las favelas de Río de Janeiro y hacer creer siempre que Ciudad del Este es el oasis del contrabando cuando que es su gente la que mayor provecho saca del desorden en Triple Frontera?”

Abaixo, segue também a resposta da cantora citada, bastante lúcida, no que pude entender, e o pedido de desculpas da Sportv, o mínimo que poderiam ter feito depois da besteira.

 

1 de julho de 2010

Ainda a união civil ou: pra que tanta danação?

Recentemente, como era esperado, todos os principais candidatos a presidente se declararam a favor da união civil de pessoas do mesmo sexo. A diferença de Marina é que, por sua religião, ela condena o casamento entre homossexuais, enquanto os outros dois tendem a deixar para cada religião decidir sobre o tema.
 
Por conta de uma provocação em outro blog, deu vontade de explicitar melhor meu post sobre esse assunto. Tentei fazer ressalvas à ideia de que, admitindo a diferença com os movimentos pela liberdade sexual, Marina entrava num patamar superior de moralidade em relação aos demais candidatos, que prefeririam esconder-se sob disfarces. Mas a discussão do posicionamento em si também pode ser interessante.

É claro que o Estado não deve se imiscuir em crenças religiosas, a não ser que atentem contra direitos humanos. Como só entra na religião quem quer, as igrejas têm direito de dizer que uniões considera válido sacramentar. Né não? 

 
Mas a questão não é, obviamente, essa. Se um candidato, por conta de crenças religiosas, considera mais digno de sacramento certo tipo de união, aquela entre homens e mulheres, ele está, sim, lançando uma condenação moral aos casais que fogem à regra. O casamento e, por tabela, o sexo, entre homem e mulher, para constituir família, são aceitos, sob a bênção do sacerdote. Não importa se você é um cafajeste, corrupto, mentiroso, a heterossexualidade te dá o direito de ter sua união reconhecida. Você é acolhido na comunidade. As portas do céu estão lá, abertas. Agora, seja você, não digo um santo, mas um sujeito normal, ou sei lá, uma pessoa mais ou menos boa, e homossexual, então dane-se (literalmente). A comunidade não te aceitará dessa forma. Se disfarce. Minta para pertencer. Mude. Seu encontro com o capeta está, do contrário, praticamente garantido.
 
Pra mim Marina tomou uma posição do tipo “a César o que é de César” porque, em seu caso, a união civil entre pessoas do mesmo sexo é aceita como coisa do mundo terreno, com suas regras e características próprias, do carnal, da corrupção, da perdição, do desespero. É justo reconhecer esse direito como é justo pagar o imposto de renda, ainda que a ordem das coisas no mundo esteja infinitamente distante daquela do reino dos céus. Já o casamento é da ordem do divino, da lei superior, do espírito, do caminho da vida, da salvação, da esperança…
 
Como se sentem pessoas que apenas querem ficar com quem gostam, ou mesmo se comportar sexualmente da forma que desejarem, diante dessas legiões de sacerdotes tachando de pecaminoso um modo de vida que lhes parece mais natural, ou desejável, e que não prejudica a ninguém? Não é só algo incômodo, como orquestras de vuvuzelas, é uma tortura lenta, cruel. Eu que não vou considerar isso aceitável, já tenho muitas culpas.
 
Marina é legal, anos luz à frente do nível médio da nossa política. Mas pra mim as crenças de um candidato, inclusive as religiosas, se forem de algum jeito discriminatórias, devem sim ser levadas em conta nas nossas escolhas.